Desembargador Miguel Thomaz Pessoa participa de sua última sessão no Pleno e deixa mensagem aos novos magistrados

Rômulo Cardoso Quinta, 12 Fevereiro 2015

Desembargador Miguel Thomaz Pessoa participa de sua última sessão no Pleno e deixa mensagem aos novos magistrados

Na segunda-feira, dia 9 de fevereiro, o desembargador Miguel Thomaz Pessoa Filho participou de sua última sessão no Tribunal Pleno, quando falou aos seus pares sobre sua trajetória e últimas atividades jurisdicionais, além do recente trabalho dedicado à comissão de obras do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR).

Prestes a ser atingido pela aposentadoria compulsória, a despedida mereceu discurso emocionado, onde Miguel Pessoa falou da dedicação e experiência ao longo dos mais de 40 anos de ininterrupta prestação jurisdicional.

O desembargador também conversou com a AMAPAR e pediu para que seu discurso - o epílogo - fosse divulgado aos associados. No texto, o magistrado concita os jovens magistrados para que reflitam sobre a responsabilidade do cargo, cujo limite está na consciência. “O magistrado só se realizará efetivamente se for comprometido com a responsabilidade do cargo. O encargo é pesado, mas o desempenho adequado realiza o juiz”, pontuou.

Como jubilado, o desembargador afirma que não pretende exercer trabalhos na área jurídica. Daqui para frente estará ainda mais dedicado aos filhos e demais familiares. Também foi convidado pela presidência do TJ para que continue a auxiliar a comissão de obras – onde as metas prioritárias estão na reforma do Palácio da Justiça e o início da construção do sonhado Centro Judiciário para o 1º grau de Curitiba.

Confira abaixo a íntegra do texto dedicado aos magistrados do Paraná.

EPÍLOGO

No momento em que me despeço da magistratura ativa, para a qual dediquei minha vida profissional, questiono-me acerca das questões relevantes que posso destacar com a experiência adquirida ao longo de mais de 40 anos de efetiva prestação jurisdicional.

Com a investidura no cargo o Estado nos delega o poder de julgar os conflitos sociais formalizados no processo judicial, decidindo sobre bens, direitos e obrigações, e ainda acerca da liberdade de nossos concidadãos.

O exercício do poder de decidir é de extrema relevância, principalmente pela liberdade do julgador, cujo limite é a sua consciência. A responsabilidade, contudo, é imensa. Estamos interferindo, em nome do Estado, na trajetória de vida das partes.

Concito os jovens magistrados a sempre refletir sobre essa questão. Cada processo é único, como únicas são as pessoas. A habitualidade do convívio com o processo pode facilmente nos levar a um julgamento rápido e superficial, pressionados pelo volume de serviços. Não podemos esquecer que há vidas em jogo por trás dos arrazoados da lide.

Valemo-nos hoje de imprescindível auxilio de assessores, porém impõe lembrar que a decisão de cada caso é de responsabilidade exclusiva nossa.

O conhecimento jurídico é essencial. Ao magistrado é exigido permanente estudo do direito. A decisão, contudo, haverá de surgir do estudo aprofundado da prova. A técnica jurídica, na avaliação da norma é ferramenta para o magistrado avaliar os fatos, mas sua responsabilidade é fazer justiça ao caso concreto. Não raro se observa: decisões jurídicas na sua forma; mas que não fazem justiça ao caso concreto.

O magistrado só se realizará efetivamente se for comprometido com a responsabilidade do cargo. O encargo é pesado, mas o desempenho adequado realiza o juiz.

Nunca podemos esquecer que se escolhemos esta profissão, devemos ser inteiramente devotados a ela, pois a vida de que dispomos é efêmera. Ao alcançar os 70 anos, encerrada a carreira, deixamos uma herança de respeito ao judiciário; se medíocres, nossa vida profissional não teve justificativa.

Vivenciamos em nosso país momentos de insegurança política. O desejo de submeter à república a uma democracia de fachada é evidente. A efetiva manutenção do regramento constitucional passa pela responsabilidade de um judiciário coerente.

Cada um de nós é o judiciário. Nossa responsabilidade não se resume a decisão judicial. A conduta na vida pública e particular do magistrado deve ser espelho para a sociedade. A força do judiciário encontra-se exatamente no respeito da sociedade.

Assisti inúmeras posses de magistrados e sempre me chamou atenção à propriedade dos pronunciamentos da oração do representante daquele grupo. Em todos, sempre observei o perfeito entendimento do alcance da responsabilidade do magistrado ao assumir o cargo e o comprometimento em assim agir.

Entristece-me ver, com alguma frequência, juízes se prevalecendo do cargo para desrespeitar normas elementares de conduta, imposições administrativas que devem ser seguidas por todos. Se a norma é injusta deve opor-se através da via legal para que seja abolida a todos. Se o homem comum deve segui-la, com mais razão o magistrado.

O judiciário que temos hoje é o resultado do trabalho de todos que nos antecederam e responsabilidade nossa pelo presente.

Interessante observar as galerias de fotos que o Tribunal mantém de todos os desembargadores na esplanada do prédio anexo, como também o destaque dos ex-presidentes, onde deparamos com a foto do Des. João Antonio de Barros Júnior, então presidente no período de 1.894 a 1.903, e na sequencia quantos homens probos que se dedicaram ao judiciário do Paraná. Também na galeria dos Vice-presidentes, começa com a foto do Des. Hugo Simas pelo período de 1.933 a 1.940, e a sequencia até os dias de hoje.

Somam-se valorosos Juízes de Direito que encerraram a carreira antes de chegar ao Tribunal e os que hoje atuam em todas as comarcas do Paraná.

Somos limitados no tempo, mas cada qual honrando o cargo que ocupa quando em atividade, constrói o judiciário e deixa sua marca nos exemplos que serão percebidos pelos que o cercam. Responsabilidade muito grande e dever assumido ao envergarmos a toga pela vez primeira prometendo cumprir com honra e retidão o cargo.

Outra qualidade imprescindível ao magistrado é a humildade, se busca desempenhar por inteiro o encargo assumido perante o Estado. O dever se sobrepõe ao poder que acumula. Ninguém desconhece o alcance desse poder, sendo desnecessário verbaliza-lo aos que nos cercam.

Merece destaque o exercício da Presidência do nosso Tribunal de Justiça pelo Des. Guilherme Luiz Gomes, exemplo de magistrado que encarna a virtude da humildade. Soube conduzir com firmeza e serenidade o judiciário, enfrentando período de turbulência e hoje vivenciamos um Tribunal sereno e uma magistratura unida. Foi apoiado por integrantes da cúpula de dedicação ímpar e que integram a nova direção do Tribunal.

Os servidores da justiça são peças fundamentais para sua efetivação. Lembro com carinho de todos com quem atuei e destaco o fato da fidelidade de todos. Nenhum deles se omitiu a responsabilidade dos seus cargos. Jamais instaurei qualquer processo administrativo e todos mereceram elogios.

O julgador sereno realiza-se no silencio do seu gabinete analisando a prova dos autos, em busca da verdade real, em meio a tantas inverdades. De regra os depoimentos, e não raras vezes os arrazoados, relatam meias-verdades sobre os fatos, visando induzir o julgador a decisão que lhes interessa. Na análise de crimes bárbaros com inevitável condenação, impõe dosar a pena avaliando as circunstâncias que a agravam e atenuando onde justifica. Por vezes, em que pese a gravidade do crime imputado, o acusado não tem responsabilidade. Em meio a tanta sordidez o juiz deve estar atento aos casos de justificável afastamento da acusação.

A par da experiência alcançada, o emprego do bom-senso, característica imprescindível ao magistrado, impõe buscar sintonia com a força superior que nos atribui o Juiz dos Juízes, (referência utilizada com frequência pelo eminente Des. Luis Renato Pedroso). Dele emana a força do amor, disponível a todos que a buscam. Com visão transcendente consegue o magistrado alcançar seu desiderato: julgar com imparcialidade.

Para finalizar, cito Rui Barbosa: (Oração dos Moços).

De quanto no mundo tenho visto, o resumo se abrange nestas cinco palavras, NÃO HÁ JUSTIÇA SEM DEUS.

Muito obrigado.

Curitiba, 09 de fevereiro de 2015.

Des. Miguel Thomaz Pessoa Filho

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