Prisões em flagrante na capital paranaense passam pelo crivo do juiz Leonardo Bechara

Rômulo Cardoso Quinta, 19 Maio 2016

Prisões em flagrante na capital paranaense passam pelo crivo do juiz Leonardo Bechara

 

Respeito recíproco e seriedade são as impressões latentes, que pairam atualmente na Central de Custódias de Curitiba. Para que a ordem seja estabelecida e permaneça intacta, o juiz Leonardo Bechara Stancioli, 41 anos, que atua como diretor de segurança da AMAPAR, não tem medido esforços desde a designação, na semana passada, pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), e passou a coordenar todo o trabalho no local.

A responsabilidade do magistrado é grande. Passa pelo cotidiano inerente às funções do juiz, com a realização das audiências de custódia dos presos em flagrante – em toda grande Curitiba.

Em tese, Leonardo Bechara tem o condão de determinar a liberdade provisória ou decretar a prisão preventiva de todas as pessoas que cometem delitos na cidade e são presas em flagrante.

A parcela de coordenador desempenhada à risca por Bechara está em deixar o funcionamento do prédio em perfeita ordem. O transporte adequado dos presos, a atenção dos seguranças e de oficiais da polícia, a lâmpada que faltou, o café, tudo está sob os olhos atentos do juiz. Ele prega respeito não apenas pelo trabalho, mas também pela história do lugar, que abrigou o presídio do Ahú por muitos anos e agora começa a dar luzes ao tão esperado Centro Judiciário de Curitiba.

“Eu sou o primeiro a chegar e o último a sair”, pontua o magistrado, que também se destaca pelo trato amistoso, de respeito e simpatia - na dose certa – com servidores, seguranças e policiais. Todos o tratam não apenas como a autoridade máxima do local, mas exemplo de comprometimento com o trabalho.

O lema de Bechara para conduzir as audiências é “educação máxima, firmeza total”. Ele não alivia no trabalho, faz em média 30 audiências por dia. Os delitos mais comuns, que passam pelo crivo do magistrado são crimes contra o patrimônio. “Existem delitos de toda natureza. Todavia, além do tráfico de substância entorpecente, verifica-se que o maior índice é de crimes contra o patrimônio, principalmente os delitos de roubo, com emprego de arma de fogo e tamanha violência, ademais dos inúmeros delitos de furto”, conta.

Confira mais sobre o importante trabalho desempenhado pelo magistrado na entrevista a seguir.

 

AMAPAR - Dr. Leonardo, como foi arquitetada a ida do senhor para a central de custódias de Curitiba?

LEONARDO BECHARA - Foi, na verdade, uma deliberação conjunta entre os magistrados, apoio da Associação dos Magistrados do Paraná e respaldo do Tribunal de Justiça do Paraná, o qual me confiou essa importante missão, de coordenar a Central de Custódias, que, para mim, trata-se de um dos elos mais fortes de todo o sistema penal.


AMAPAR - Hoje, a vara em que o senhor passou a atuar é a única que analisa as prisões em flagrante na capital paranaense. Isso significa que o senhor terá o poder de decidir sobre a liberdade ou a manutenção da prisão Em Curitiba…

LEONARDO BECHARA - Exatamente. É na central de custódias que serão analisadas todas as prisões em flagrantes ocorridas na cidade de Curitiba, oportunidade em que será deliberado sobre o destino da liberdade do flagranteado, podendo ser sua prisão convertida em custódia preventiva, ou, noutro passo, ser concedida a sua liberdade provisória, com ou sem fiança, com aplicação, ou não, de medidas cautelares, ou mesmo relaxada sua prisão em caso de patente ilegalidade no procedimento.


AMAPAR - Mesmo sendo um entusiasta e estudioso do direito penal, como o senhor afere o tamanho da responsabilidade?

LEONARDO BECHARA - Para mim é uma grande honra merecer a confiança do Tribunal de Justiça do Paraná. A grandeza do poder que me foi conferido segue diretamente atrelada à enorme responsabilidade, jurídica e social, das decisões que ali serão tomadas.

 

Não posso me esquecer da existência de uma vítima, ou vítimas, que reclamam por justiça e que confiam no Poder Judiciário”

 

 


AMAPAR - Pelo que o senhor tem notado, a audiência de custódia tem cumprido seus propósitos? A diminuição da massa carcerária pode encontrar guarita nas audiências de custódia ou ainda é um trabalho passo a passo?

LEONARDO BECHARA - A ideia das audiências de custódia é grandiosa, em todos os sentidos.

O que não se pode descartar é a preocupação de estar o Poder Judiciário sendo chamado a responder por questões que escapam à sua competência, vale dizer, desafogar a massa carcerária é de responsabilidade do Poder Executivo.

Não se faz concebível imaginar o Poder Judiciário encampando essa tarefa, como muitas vezes se verifica, pensando somente índice de desobstrução do sistema, sem a observância dos requisitos e pressupostos aptos a respaldar a concessão da liberdade, vulnerando, em outra vertente, outros interesses e direitos também de estatura constitucional.

Aos cidadãos que porventura venham a ser presos e submetidos à audiência de custódia, ao menos as que por mim forem presididas, serão garantidos todos os direitos constitucionais e legais, todavia, não haverá inversão de valores, pois não posso me esquecer da existência de uma vítima, ou vítimas, que reclamam por justiça e que confiam no Poder Judiciário.


AMAPAR - Como o senhor confronta a ideia de que a audiência de custódia serve como mero procedimento para a soltura de presos em flagrante?

LEONARDO BECHARA - Acredito ser uma ideia absolutamente equivocada, mas que criou raiz por diversos acontecimentos aventados e levados à sociedade, que hoje cobra uma resposta efetiva e contundente do Poder Judiciário.

A sociedade, isso posso dizer por mim, e não pelos outros, poderá confiar em uma atuação segura, firme, que venha equilibrar os interesses sociais/repressivos, com a ideia embrionária das audiências de custódia.

A minha atuação se anelará às propostas da custódia e que edificam a sua criação. Haverá um consequente esvaziamento do sistema, na medida em que serão filtradas as prisões e relativizadas aquelas que não se sustentam, ou seja, só permanecerá preso quem merecer o cárcere.


AMAPAR - Como o senhor tem analisado a atuação das polícias civil, militar e de delegados no que tange às prisões e nos procedimentos de encaminhamento para que o preso seja apresentado ao senhor em tempo hábil?

LEONARDO BECHARA -Está havendo uma cooperação entre as instituições de segurança pública, voltadas ao interesse de resolução dos problemas e legitimação dessa importante ideia.

 

“O Direito penal me dá a oportunidade de conhecer o ser humano na sua essência, de me conhecer em essência e de pautar meus atos na incessante busca da justiça”

 

AMAPAR - E a estrutura de trabalho, qual avaliação o senhor faz? Considera satisfatória? Tem algum ponto que mereça observação para que o trabalho seja desempenhado a contento?

LEONARDO BECHARA - O Centro de Audiência de Custódia, a cada dia, e sob a minha supervisão, estará se aprimorando em todos os sentidos. Por óbvio, temos que transitar pelas dificuldades que são inerentes. O que importa é que estamos tendo todo o apoio do Tribunal de Justiça, o qual nos respalda e impulsiona na concreção desse objetivo tão relevante.

AMAPAR - Acerca do que dispõe a legislação e jurisprudência, como o senhor tem analisado a necessidade de manutenção da prisão, de acordo com os tipos de crime, e quando o senhor avalia a soltura?

LEONARDO BECHARA - Primeiramente, além dos requisitos objetivos inerentes à essência das custódias preventivas, ou da conversão em prisão preventiva, o que mais se leva em consideração é a vida ou histórico criminal da pessoa presa e o risco concreto que ela apresenta à sociedade ou ao procedimento que eventualmente venha a responder. A partir dessa análise, chegamos à conclusão se a pessoa merece ou não sua liberdade.


AMAPAR - Recente declaração de representantes dos policiais no Paraná, em jornal de grande circulação, coloca a audiência de custódia como mero instrumento para enxugar gelo, pois oficiais têm constatado que o índice de reincidência continua preocupante. Qual a opinião do senhor?

LEONARDO BECHARA - Essa preocupação aventada pelos policiais, também é uma preocupação de toda a sociedade.

Confesso que é também a minha preocupação, ou seja, preocupo com o fato de estarem as pessoas acreditando, de forma equivocada, o que representa a audiência de custódia. Seria mais conveniente apontarmos o dedo e criticarmos também a atuação dos órgãos de segurança, sustentando que estão tentando transferir a responsabilidade, ou mesmo mudando o foco do problema, para algo novo e que está, aos poucos, legitimando-se.

O que ocorre é que essa não é minha maneira de atuar. Entendo os problemas e aceito as críticas como maneira de se aprimorar o sistema. Mas uma coisa eu afirmo: a ideia da audiência de custódia irá se enraizar na sociedade, cada vez com mais força, para tanto, imprescindível se faz o papel da imprensa na divulgação exata dos dados e estatísticas. O Poder Judiciário em atuação conjunta com os órgãos de imprensa fortalecem e engrandecem o Estado Democrático de Direito.

AMAPAR - E a experiência no Júri, em linhas gerais, como o senhor descreve?

LEONARDO BECHARA - O Tribunal do Júri é minha casa. Lá, aprendi o que não se aprende nos livros da faculdade. Um dia, em breve, voltarei como titular daquela casa, e defenderemos, na mesma esteira ideológica do Dr. Daniel Avelar, uma instituição forte, que merece ser sempre respeitada, em razão de sua própria história.

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